"os teus estados emocionais são esquisitos"

acabo de ouvir.
Pois bem podem ser. Mas há um lugar que me deixa normal, muito normal. Talvez como vejo as outras pessoas serem - sempre tão seguras! tão pessoas! tão ELAS.

É o meu local seguro. E secreto.

Claro - não poderia ser de fácil conhecimento. Nem acesso.

E isso rói-me por dentro. Porque queria lá ir. AGORA. JÁ!

Porque é assim que sempre quero as coisas. Agora e já. Ou para antes, se for possível.

Mas o meu lugar... tenho a dizer que é bonito. É arrasador.
O mar assusta-me um pouco, embora me deleite nele sempre que possível - não se sabe o que está a um metro de distância ou que criatura ronda o meu corpo quando já estou demasiado longe da areia. (também me assusta estar em terra mas pelo menos sei que criaturas essas são...)

Mas do meu lugar, vê-se tudo. Vê-se para lá do horizonte e depois disso.
Vê-se a vida de cima, de alto a baixo.
É absolutamente lindo de se estar e faz-me nem importar com a luta do vento e o frio na cara.

É um lugar para onde vou sem nada. Fico em silêncio e por vezes deixo-me assustar pelo mau tempo que me chicoteia na cara com areia, com a maré que sobe e parece querer engolir-me.

Será que lá no fundinho eu gostava era que isso acontecesse de verdade? Ser levada para um novo mundo por azar da coisa. "Oh que chatice!"

Mas cada vez tenho mais receio de lá ir... O caminho é literalmente tortuoso. Para além de ser longo, é feito de obstáculos e de acrobacias para os ultrapassar. É sempre escuro, mesmo quando está Sol.

Imagino algumas pessoas a terem o mesmo sítio secreto que eu - e dessa forma deixa de ser menos secreto e mais susceptível a tornar-se (mais) perigoso.

Mas eu não me importo. Não me importo de não ouvir a minha própria voz até mesmo quando grito - o vento engole todos sons.

Ouve-se mar, vento e nada mais.
Sente-se de tudo e de nada.

A adrenalina de lá ter chegado e parecer sempre a primeira vez.
A cabeça aproveita logo para descarregar.
Os filtros soltam-se e folhas de cor - uma para aquela questão, uma para aquele porquê, outra ainda para aquele grito primal de "não percebo" - vão embaladas com as gotículas de sal e os grãos agrestes de areia que acompanham a dança do vento.

Depois? Só posso dizer que não há nada. Absolutamente nada. Apenas dou conta do tempo que lá passei, imóvel, quando me vou embora - e já não me lembro de como é levantar-me.

Saio de lá com a pele fria e molhada, com areia por todos os cantos e os lábios a saber a sal.

Mas por tudo o que tem de agreste, tem de removedor. Por cada pulsão, explode um sentimento que se desvanece mesmo ali à minha frente.

Passado pouco, nada há a sentir. É só absorver.
Absorver o nada é importante porque não é tarde que se volta a encher a cabeça.
Mal me levanto e tenho tempo para me preparar para a viagem atordoante... vvvvvssssccccc! Um tornado de vento persegue-me e espeta-me com novas folhas na cara. Novos porquês, novas questões.

Mas o importante não é isso. É que enquanto se está em silêncio, o tempo parece eterno. E assim, indo ao local secreto de vez em vez, posso rasgar as folhas e gritar-lhes para não voltarem.

Eu sei que voltam - sei também que podem desaparecer.

Mas hoje estou triste porque cada vez mais tenho medo de lá ir.

Como gostava de perder o medo - que sei não ser infundado. Queria que aquele local fosse só meu, rodeado por espelhos para criar um espaço fechado e ainda assim, aberto. Ninguém mais saberia dele e eu podia ver todas as criaturas da terra sem que me vissem a mim...

Preciso de vento. De sal. De água e de vento. Mas assim tudo atirado com a raiva que só a natureza sabe criar - em cheio nos ombros à chuva.

Com chuva era mais certo estar completamente sozinha - mas com chuva não serei nunca capaz de lá ir... Porque de tão belo o meu lugar que me faz querer reservá-lo. Para quando não tiver medo. Menos medo, pronto.

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